Poluição climática no Brasil cresceu 40% na última década
O SEEG – Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima divulgou na última semana o relatório “Análise das Emissões De Gases de efeito estufa e Suas Implicações Para As Metas Climáticas Do Brasil”.
Confira abaixo a íntegra do Press Release produzido pela jornalista do Observatório do Clima Solange A. Barreira.
Brasil teve “década perdida” no combate a emissões
Décimo relatório do SEEG mostra que poluição climática aumentou 40% desde que país regulamentou lei para combatê-la, em 2010
Do Observatório do Clima – As emissões brasileiras de gases de efeito estufa cresceram 40% desde o ano em que o país decidiu tomar uma atitude para combatê-las. A “década perdida” da luta contra o aquecimento global no país é tema do décimo relatório de análise das emissões brasileiras do SEEG, o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima.
Em 2010, quando o país regulamentou a Política Nacional sobre Mudança do Clima, a PNMC, as emissões brutas de gases de efeito estufa eram de 1,7 bilhão de toneladas. Em 2021, ano da última estimativa do SEEG, eram 2,4 bilhões.
“Esses números indicam que, embora a PNMC tenha produzido inovações importantes no ordenamento legal brasileiro e criado instrumentos para mensuração de emissões e combate à mudança do clima, do ponto de vista da atmosfera, a década de 2010 foi perdida para o Brasil”, afirma o documento do OC.
A maior parte da culpa, você adivinhou, é do desmatamento. O Brasil passou longe de cumprir a principal meta da PNMC, reduzir em 80% a taxa de destruição da Amazônia. Ao contrário, em 2022 o desmatamento era quase três vezes maior do que os 3.925 km2 preconizados pela meta. Em 2021, as emissões brutas por desmatamento em todos os biomas brasileiros haviam atingido 1,19 bilhão de toneladas (Gt) de gás carbônico equivalente (CO2e). É mais do que o Japão emite em um ano. Em relação a 2010, as emissões por mudança de uso da terra cresceram 83% no Brasil.
As emissões líquidas, quando se desconta o carbono removido por florestas secundárias e por áreas protegidas, cresceram ainda mais: 55%, de 1,3 bilhão para 1,7 bilhão de toneladas. Isso indica o descontrole do desmatamento e o aumento da devastação em unidades de conservação e terras indígenas, em especial nos últimos anos. Ou seja, o “ralo” natural de carbono do Brasil está menos eficiente por culpa das motosserras.
Mas todos os setores da economia aumentaram suas emissões: a alta bruta foi de 31% em resíduos (principalmente lixo e esgoto), 13% em processos industriais e uso de produtos, 17% em energia e 12% em agropecuária entre 2010 e 2021.
No setor de energia, o período foi marcado por uma intensa “fossilização” da matriz elétrica com o aumento no número de usinas termelétricas fósseis, bem como o aumento do uso do diesel nos transportes. A alta nas emissões em 2021 foi a maior em 50 anos, e ao longo da década ela só não foi maior por causa da entrada maciça de fontes renováveis, principalmente eólica e solar, na matriz elétrica, além do crescente uso de biocombustíveis na atividade de transportes. Isso reflete a deficiência do plano setorial de energia da PNMC, que se limitava a seguir o que já estava planejado pelo governo no chamado Plano Decenal de Energia.
Em agropecuária houve crescimento tanto do rebanho bovino quanto do consumo de fertilizantes, o que aumentou as emissões brutas. O Plano ABC, a política de redução de emissões do setor agrícola, porém, foi bem-sucedido: as tecnologias promovidas pelo plano e pelo programa homônimo do Ministério da Agricultura (que, no entanto, segue respondendo por menos de 2% do financiamento do Plano Safra há mais de uma década) ajudaram a aumentar o sequestro de carbono por solos bem manejados no Brasil. Hoje os solos agrícolas já sequestram duas vezes mais carbono do que emitem, mostra a análise do SEEG. Essas remoções, no entanto, até hoje não são computadas nos inventários oficiais de emissões.
Em 2021, o Brasil deveria ter iniciado o cumprimento de suas metas para 2025 e 2030 no âmbito do Acordo de Paris, a chamada NDC, adotada em 2015. A meta era de reduzir em 37% as emissões em 2025 em relação a 2005. No entanto, o governo passado não apenas não elaborou um plano de cumprimento da NDC como tornou a meta mais fraca, por meio de um truque contábil: aumentou as emissões do ano-base sem ajustar os percentuais. A “pedalada” foi parar na Justiça e o OC recomendou ao novo governo que a desfizesse, no mínimo ajustando os percentuais para deixá-la com o mesmo grau de ambição da meta original.
Só que, como mostrou nesta semana o relatório-síntese do IPCC (o painel do clima da ONU), as metas de 2015 são insuficientes para estabilizar o aquecimento global em 1,5oC, um objetivo que a humanidade precisa perseguir se quiser minimizar o caos climático que vivemos hoje. O Brasil deve, portanto, atualizar mais uma vez sua NDC, de modo a tornar ao menos a meta de 2030 compatível com o objetivo do acordo do clima. A manutenção de uma curva de emissões em alta mesmo após 11 anos da lei nacional não facilita esse necessário aumento de ambição.
“Desde que o SEEG começou a publicar as estimativas anuais das emissões há 10 anos, observamos uma trajetória ascendente, culminando no recorde em 2021. A expectativa para a próxima década é observar uma reversão, puxada pela redução e até a eliminação do desmatamento líquido. Também esperamos acompanhar a diminuição da intensidade de emissões de todos os outros setores, que passarão a ter mais evidência”, afirma David Tsai, coordenador do SEEG.
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