Mudanças Climáticas – “Agir agora custará menos do que não fazer nada”

Mudanças Climáticas - "Agir agora tem custo menor do que não fazer nada"

Entrevista com Stela Herschmann, especialista em política climática, do Observatório do Clima

Após a divulgação do sexto relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) no começo de abril, o terceiro em oito meses, o secretário-geral da ONU, António Guterres, foi taxativo: “Estamos a caminho do desastre. Estamos no caminho para o aquecimento global de mais que o dobro do limite de 1,5 grau Celsius que foi acordado em Paris em 2015″. 

O documento produzido pelo Grupo de Trabalho III do IPCC sugere ações urgentes para mitigar as emissões de gases de efeito estufa, com pico antes de 2025, diminuindo as emissões em 50% antes do final da década. Entre os alertas, o relatório pede uma redução substancial no uso de combustíveis fósseis para conter o aquecimento global, que agora está 1,1 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais. Também exige uma queda de 33% no metano – gás mais prejudicial que o dióxido de carbono e subproduto da agricultura animal, que também contribui para as emissões de CO2 no transporte e processamento.

Mesmo diante de um cenário preocupante, ainda é possível identificar pontos positivos no relatório. Quem fala sobre o assunto é Stela Herschmann, especialista em política climática do Observatório do Clima. Em conversa com o Blog Cidade AMA, Stela aponta que pontos são esses, o papel dos governos, cidades e sociedade para reversão deste cenário.

 

Existe algum ponto positivo no útimo relatório do IPCC?

Stela Herschmann – Sim, algumas mensagens são positivas, nunca 100% positivas. Por exemplo, as emissões estão aumentando. Isso não é bom. Mas aumentaram em um ritmo menor na última década. Isso indica que as metas climáticas assumidas pelos países começaram a fazer efeito. O relatório também mostra que em 18 países, desde o protocolo de Kyoto (1997), existe uma consistente redução das emissões de gases de efeito estufa.

Outro ponto positivo é a constatação de que existem opções de mitigação dos efeitos do clima em todos os setores. É claro que estas soluções acontecem em níveis diferentes de desenvolvimento e de viabilidade econômica, mas elas existem e podem se tornar rápidas nos próximos anos. 

O custo para cortar as emissões pela metade é de 100 dólares por tonelada de CO2 equivalente, valor considerado razoável. Mas grande parte das ações – como reduzir o desmatamento – custam até 20 dólares por tonelada. Do ponto de vista econômico, o corte que precisamos fazer nas emissões não impacta significativamente no PIB dos países. Agir é menos custoso do que não agir – essa é uma mensagem importante para mexer com a vontade política dos governos.


A responsabilidade é apenas dos governos? 

Stela Herschmann – Eu diria que sim. Hoje não temos propostas suficientes para conter o aumento da temperatura. E as propostas colocadas não estão acompanhadas de políticas públicas críveis. Os governos podem direcionar a sociedade e as empresas. A culpa pode não ser dos governos, mas a responsabilidade sim.


Como as pessoas podem contribuir imediatamente para reduzir as emissões?

Stela Herschmann – Pela primeira vez o relatório do IPCC trouxe um capítulo sobre o potencial de mitigação por mudanças coletivas. Se um coletivo de pessoas tiver mudanças de estilo de vida, de comportamento como optar por transporte sustentável, ter dietas saudáveis, fazer reciclagem, adotar energias renováveis, essas mudanças têm sim um impacto bastante significativo.

Mas é preciso ter muito cuidado neste ponto. Antes de colocar a responsabilidade no indivíduo, é preciso oferecer condições para que ele possa fazer essa mudança. Nem todos podem mudar, a maioria das pessoas não tem recursos. Hoje, 10% das casas são responsáveis por até 40% das emissões de carbono.

Quais seriam as prioridades para as cidades contribuírem na reversão desse cenário?

Stela Herschmann – Interessante como as cidades são retratadas no último relatório. A maior parte das emissões acontecem no meio urbano, e seguindo a tendência atual podem crescer muito mais. Mas por outro lado, o IPCC mostra um potencial muito grande de redução das emissões na cidade. Isso depende da mudança de consumo energético, de um transporte coletivo eficiente e não poluente e de um planejamento urbano que impeça que as escolhas erradas sejam feitas. Estamos falando de cidades mais compactas com menos gasto de combustível fóssil, por exemplo.

 



Sobre o Observatório do Clima
– Com 20 anos de atuação, o Observatório do Clima é uma rede de 37 entidades da sociedade civil brasileira formada com o objetivo de discutir as mudanças climáticas no contexto brasileiro, mais especificamente o aquecimento global.

Sobre o IPCC – O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas foi criado em dezembro de 1988 pela Organização Meteorológica Mundial e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. é um comitê composto de centenas de cientistas do mundo inteiro escolhidos pelos governos com a missão de avaliar periodicamente o estado da arte do conhecimento científico sobre as mudanças do clima. Essas avaliações são publicadas periodicamente, na forma dos chamados Relatórios de Avaliação. Os cientistas e os relatórios se distribuem em três grupos de trabalho: o Grupo 1 (WG1), que trata da base física (as causas) das mudanças do clima, o Grupo 2 (WG2), que trata de impactos, vulnerabilidades (as consequências) e adaptação, e o Grupo 3 (WG3), que lida com a mitigação (as soluções).

 

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